A Igreja aponta como exemplo uma mulher que achava injusto produzir filosofia e fechar os olhos à miséria. A canonização de Edith Stein, no dia 11 de outubro de 1998, como todo ato solene da Igreja ao declarar a santidade de uma pessoa, apresentou-a como modelo de vida.
Santa Teresa Benedita da Cruz — nome que Edith Stein adotou ao entrar no Carmelo — buscou no recolhimento interior a fonte de um dinamismo avassalador que a levou a uma produção de mais de mil e quinhentas páginas impressas, numa das quais declarou: "quanto mais profundamente alguém é atraído para Deus, tanto mais intensamente deve 'sair de si' para irradiar ao mundo vida divina".
Nascida em 12 de outubro de 1891, Edith Stein foi a sétima filha de um casal de judeus piedosos habitantes de um gueto na cidade de Breslau (hoje Wroclaw, no sudoeste da Polônia). Seu pai morreu em uma viagem de negócios quando ela tinha apenas três anos, o que fez sua mãe assumir o comércio familiar de madeiras. Com o amadurecimento nos estudos, especialmente da filosofia, irá se desligando da religião: "a sede da verdade era minha única prece". Em Göttingen, reúne-se ao grupo da fenomenologia de Husserl, de que faziam parte Dietricht von Hildebrand e Max Scheler. Dedica-se com empenho às pesquisas acadêmicas até que em agosto de 1914 interrompe os estudos e ingressa na Cruz Vermelha para colaborar no cuidado das vítimas da primeira Guerra Mundial.
Husserl a convida para ir a Friburgo organizar os seu manuscritos em 1916. Edith Stein doutora-se no ano seguinte. Mulher sóbria, mas com muitos amigos, como os Conrad´Martius, na casa dos quais passa uma temporada para descansar um pouco. Era uma residência de férias na Baviera. Numa noite de insônia, procura um livro e toma nas mãos uma obra de Santa Teresa de Jesus, o Livro da Vida, que é uma narração clássica, na verdade um convite que em certas passagens adquire um tom de intimação carinhosa para que a alma entre por caminhos de oração. No dia seguinte providencia um missal e um catecismo que estudará cuidadosamente. Dias depois, assiste à Santa Missa e pede ao pároco que lhe administre o batismo.
Após ter sido advertida de que é necessária uma preparação prévia — a catequese — Edith pede que ele a interrogue. Admirado com os conhecimentos da jovem, o sacerdote marca a data do batismo para o dia 1º de janeiro de 1922, e ela escolhe o nome cristão de Teresa. A conversão de membros de famílias hebraicas provoca uma mudança de vida. Edith Stein não ignora a profundidade das conseqüências de sua atitude, mas faz questão de contar para a mãe a sua opção. Cai de joelhos à sua frente e diz: "Mamãe, eu sou católica". Anos mais tarde recorda que foi a primeira vez que a viu chorar. Carinhosa e filial, permanece em Breslau seis meses acompanhando a mãe e freqüentando com ela a sinagoga. Não há como negar os fatos, e a anciã deixa-se impressionar: "Eu nunca vi ninguém rezar como Edith".
Após doze anos de espera, ingressa no Carmelo em 15 de outubro de 1933. Nos intervalos entre as atividades do convento, escreve muitas obras, como o livro Ser finito e ser eterno, um tratado sobre o homem e Deus em que se ocupa da Einfühlung, ou empatia, tema próprio da fenomenologia. A empatia para ela é uma das várias possibilidades de encontrar o outro e viver em uma comunidade. Na sua opinião é injusto produzir filosofia e manter-se alheio à miséria e às mortes do mundo. Para fugir do nazismo dirige-se, sob ordens de suas superioras, a um carmelo em Echt, na Holanda, onde aprenderá seu sétimo idioma, o holandês.
Para a fenomenologia, o aparecer dos conceitos na mente, a intuição, a experiência vital são temas centrais. Como o valor de uma doutrina se mede pela sua potencialidade de ser encarnada em pessoas, o valor da obra de Edith é significativo — seu último livro, A ciência da cruz, foi uma espécie de antevisão do que aconteceria com ela. No dia 2 de agosto de 1942 os oficiais nazistas buscaram-na no parlatório do convento. Em sua última carta às monjas diria: "A ciência da cruz não se pode adquirir sem que ela nos pese realmente sobre os ombros. Desde o primeiro instante eu estava convencida, e a mim mesma me dizia: Ave crux, spes unica!".
A data e o local exato de sua morte são desconhecidos, sendo bastante provável que tenha morrido em Auschwitz, entre 2 e 9 de agosto de 1942. Na cerimônia de sua canonização, a que assistiram milhares de pessoas, o Papa João Paulo II disse que o ato deveria ser uma "ponte de compreensão" entre os católicos e os judeus. A declaração de santidade de uma pessoa que viveu a espiritualidade católica deve ser interpretada como uma proclamação de que os melhores exemplos para os católicos são os santos, entre os quais está Edith Stein. Como autêntica judia, solidarizava-se com os sofrimentos de seu povo. Como autêntica cristã, soube encontrar a Cruz nos horrores da perseguição nazista.
Em suas palavras, "mas agora se acendeu de repente uma luz em mim! Deus tinha colocado de novo sua mão bem pesada sobre seu povo e compreendi que a sorte desse povo era também a minha", e "o que se poderia dizer a mim para consolo? Consolo humano certamente não há, mas quem coloca a cruz como passagem para a vida, entende que o peso se torna suave e leve". Não há cristianismo verdadeiro, genuíno, sem participar, de algum modo, no mistério da Cruz. Os santos compreenderam essa realidade, e a Cruz os eleva até os cumes do amor de Deus: dar a vida. A Igreja aponta como exemplo uma mulher que achava injusto produzir filosofia e fechar os olhos à miséria.
Fonte: http://www.comshalom.org/formacao/santos/edith_stein.html
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