A atual legislação canônica permite que a comunhão seja dada sobre as mãos dos fiéis, observados certos cuidados e afastados os perigos de irreverência ou sacrilégio. Tal permissão não significa que esta forma, que vigorou nos tempos primitivos, seja a mais adequada aos dias atuais. Não por acaso, foi proibida durante séculos, na medida em que surgiram heresias que solapavam a fé, a piedade e a reverência.
Minha geração aprendeu nos seminários que o modo antiquado se tornara moderno e que expressaria mais adequadamente a emergência de uma fé "adulta". Comungar de pé e nas mãos tornou-se sinônimo de "tomada de consciência" e "engajamento"; enquanto a forma tradicional, de joelhos e na boca, passou a ser tolerada para as velhinhas que se aproximam meio sem saber bem o que fazem. Nalguns lugares, a recepção de joelhos foi sendo dificultada, noutros proibida (sic!).
Nós, padres da minha geração, aprendemos e ensinamos durante anos que a forma antiquada devia ser promovida, até que o Papa Bento XVI, com seu magistério do exemplo, levou-nos a questionar velhos e novos "dogmas". Em suas missas, distribui exclusivamente a Sagrada Comunhão na boca aos fiéis ajoelhados; os demais ministros distribuem-na exclusivamente na boca aos fiéis de pé.
Há razões teológicas e pastorais para agir assim. Encíclicas sobre a Santíssima Eucaristia não são suficientes para promover a fé e a piedade. Quantos de nossos fiéis as leem? Homilias, palestras, estudos, todos falam aos ouvidos - e é verdade que a "fé vem pelo ouvido" - mas não somos somente ouvido. A moderna psicologia não despreza nossa capacidade de apreensão e expressão através dos demais sentidos, como parece fazer nossa moderna pastoral.
Santo Agostinho ensina que "Nemo autem illam carnem manducat, nisi prius adoraverit" ou, em linguagem vulgar, que ninguém coma desta carne sem antes adorá-la. Qual das formas expressa, do ponto de vista litúrgico, mais adequadamente a adoração devida à carne do Senhor? Somente uma mente muito afetada pela ideologia poderia negar que a posição de joelhos e a comunhão recebida na boca seja a resposta justa.
Conhecemos bem os argumentos contrários. Vão das razões de higiene ao clássico axioma: o importante é o coração. Pois bem, então que acabemos com todos os signos litúrgicos e nos tornemos de vez protestantes, reduzindo o culto a palavrório e musiquinhas sentimentaloides. Aliás, bem anti-higiênica a lama que Nosso Senhor fez com saliva para ungir os olhos do cego de nascença, mandando-o em seguida lavar-se na piscina de Siloé (Jo 9,6-7), e quão desnecessária para Aquele que conhece o íntimo dos corações, não é mesmo?
Há quem cite, sem conhecer seu profundo significado, as palavras de Nosso Senhor sobre os "verdadeiros adoradores". Aqui não cabe uma exegese sobre as palavras em questão, nem sou eu o mais indicado para fazê-la. A Santa Igreja, intérprete autêntica das Escrituras, nunca entendeu tais palavras como desprezo, censura ou proibição dos sinais litúrgicos. Pelo contrário, a Encarnação do Verbo, suas palavras e atitudes e a dimensão sacramental da fé cristã são a prova mais eloquente da "corporeidade" de nosso culto espiritual.
Na minha nova paróquia, como nas anteriores, pouquíssimas pessoas recebem a Sagrada Comunhão nas mãos. Faz algum tempo, introduzi também um genuflexório na fila em que distribuo a Sagrada Comunhão, deixando os fiéis à vontade para se ajoelharem. Qual a minha surpresa com o grande número dos fiéis que optaram por receber assim o Corpo do Senhor! Sobretudo entre os jovens, a prática parece conquistar sempre mais adeptos. Preservei, evidentemente, os direitos daqueles poucos que preferem a comunhão nas mãos, salvaguardados os princípios dogmáticos e afastado o perigo de profanação.
Estranhamente os mesmos que defendem os "sagrados" direitos dos leigos parecem se opor a que se lhes dê esta opção. Na verdade, se é direito deles receber a comunhão de joelhos, não fornecer os meios, dificultar ou impedir a prática são um abuso de poder por parte dos sacerdotes. Nunca antes se viu tanto clericalismo nas fileiras sacerdotais, e qualquer fiel "adulto", "consciente" e "engajado" que não costuma se resignar às arbitrariedades de seus pastores sabe como ele se manifesta disfarçadamente, sob a capa do pastoralismo.
Sei que minha prática pastoral desagrada a "gregos e baianos". Uns consideram um retrocesso a comunhão de joelhos, outros um abuso a comunhão nas mãos. Faço o que faz, manda ou permite a Santa Igreja. Mudarei o que ela mudar, quando ela mudar. Aos incomodados, meus votos de boa viagem!
Obs.: A Comissão "Ecclesia Dei", em resposta a um consulente de Munique, esclareceu que "(...) a celebração da Santa Missa na Forma Extraordinária do Rito Romano prevê a recepção da Comunhão de joelhos, na qual a Sagrada Hóstia é colocada diretamente sobre a língua do fiel comungante". O indulto, portanto, não se estende à Missa Tradicional.
Fonte: Oblatvs
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